Wednesday, November 29, 2006

Eutanásia, ortotanásia e distanásia: breves considerações a partir do biodireito brasileiro

Texto extraído do Jus Navigandi - http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=7571

Roxana Cardoso Brasileiro Borges: doutora em Direito Civil pela PUC/SP, mestre em Instituições Jurídico-Políticas pela UFSC, coordenadora do Curso de Especialização em Direito Civil da UFBA, professora nos Cursos de Direito da UFBA, UCSal e FTC, advogada em Salvador (BA)


Sumário: Introdução. 1 Dignidade da pessoa humana como fundamento do direito à morte digna. 2 Direito de morrer dignamente e direito à morte: distinção. 3 Eutanásia, auxílio a suicídio, distanásia e ortotanásia: delimitações conceituais necessárias. 4 Eutanásia e ortotanásia no Direito Penal projetado. 5 Testamento vital. Conclusão. Bibliografia.

Introdução

Tema milenar, a eutanásia e outras expressões correlatas voltam a ocupar o debate atual sobre os limites do poder humano sobre o próprio processo de morte.
Desta vez, o problema atrai a imprensa devido ao caso norteamericano envolvendo Terri Schiavo, que faleceu em 31 de março de 2005, após encontrar-se em estado vegetativo por 15 anos, sendo alimentada e hidratada por uma sonda. Depois de uma longa disputa judicial entre seu marido e seus pais, a Justiça americana determinou, em última instância, a retirada da sonda que a alimentava artificialmente, para que o processo natural de morte pudesse ter lugar, o que veio a ocorrer depois de 13 dias sem a alimentação e hidratação artificiais.
Considerando oportuno o debate, propomos uma reflexão sobre o tema, vinculando-o ao princípio constitucional da dignidade da pessoa humana e salientando a necessidade de uma delimitação conceitual sobre o significado da eutanásia e sua distinção quanto à ortotanásia e o auxílio ao suicídio, além de breves considerações sobre a distanásia e o testamento vital.

1 Dignidade da pessoa humana como fundamento do direito à morte digna

A concepção de dignidade da pessoa humana que nós temos liga-se à possibilidade de a pessoa conduzir sua vida e realizar sua personalidade conforme sua própria consciência, desde que não sejam afetados direitos de terceiros. Esse poder de autonomia também alcança os momentos finais da vida da pessoa [01].
O avanço da medicina quanto às tecnologias à disposição do médico tem provocado não apenas benefícios à saúde das pessoas, mas, também, em alguns momentos, todo esse aparato tecnológico pode acabar afetando a dignidade da pessoa. Esses avanços abrangem, sobretudo, o controle do processo de morte.
Biologicamente, certos órgãos das pessoas podem ser mantidos em funcionamento indefinidamente, de forma artificial, sem qualquer perspectiva de cura ou melhora. Alguns procedimentos médicos, ao invés de curar ou de propiciar benefícios ao doente, apenas prolongam o processo de morte. Portanto, cabe indagar se se trata, realmente, de prolongar a vida ou de prolongar a morte do paciente terminal.
A "obstinação terapêutica" ou "encarniçamento terapêutico" pode ser definida como
"uma prática médica excessiva e abusiva decorrente diretamente das possibilidades oferecidas pela tecnociência e como o fruto de uma obstinação de estender os efeitos desmedidamente, em respeito à condição da pessoa doente" [02].
Há situações em que os tratamentos médicos se tornam um fim em si mesmos e o ser humano passa a estar em segundo plano. A atenção tem seu foco no procedimento, na tecnologia, não na pessoa que padece. Nesta situação o paciente sempre está em risco de sofrer medidas desproporcionais, pois os interesses da tecnologia deixam de estar subordinados aos interesses do ser humano. Neste momento, "em uma época consciente, mais que nunca, dos limites do científico e das ameaças de atentado à dignidade humana, a obstinação terapêutica surge como um ato profundamente anti-humano e atentatório à dignidade da pessoa e a seus direitos mais fundamentais" [03].
Hoje reivindica-se a reapropriação da morte pelo próprio doente. Há uma preocupação sobre a salvaguarda da qualidade de vida da pessoa, mesmo na hora da morte. Reivindica-se uma morte digna, o que significa "a recusa de se submeter às manobras tecnológicas que só fazem prolongar a agonia. É um apelo ao direito de viver uma morte de feição humana [...] significa o desejo de reapropriação de sua própria morte, não objeto da ciência, mas sujeito da existência" [04].
Por isso, o fundamento jurídico e ético do direito à morte digna é a dignidade da pessoa humana. O prolongamento artificial do processo de morte é alienante, retira a subjetividade da pessoa e atenta contra sua dignidade enquanto sujeito de direito.
O conceito de dignidade humana é categoria central na discussão do direito à vida e do direito à morte digna. Este conceito leva a indagações como "se o prolongamento artificial da vida apenas vegetativa não representa uma manipulação que viola a dignidade humana e se certos tratamentos coativos e não necessários não ultrajam a dignidade da pessoa" [05].

Jussara Meirelles e Eduardo Didonet Teixeira ponderam que

"é possível entender que o acharnement subverte o direito à vida e, com certeza, fere o princípio constitucional da dignidade da pessoa humana, assim como o próprio direito à vida. Se a condenação do paciente é certa, se a morte é inevitável, está sendo protegida a vida? Não, o que há é postergação da morte com sofrimento e indignidade [...] Se vida e morte são indissociáveis, e sendo esta última um dos mais elevados momentos da vida, não caberá ao ser humano dispor sobre ela, assim como dispõe sobre a sua vida?" [06].

A intervenção terapêutica contra a vontade do paciente é um atentado contra sua dignidade. A pessoa tem a proteção jurídica de sua dignidade e, para isso, é fundamental o exercício do direito de liberdade, o direito de exercer sua autonomia e de decidir sobre os últimos momentos de sua vida. Esta decisão precisa ser respeitada. Estando informado sobre o diagnóstico e o prognóstico, o paciente decide se vai se submeter ou se vai continuar se submetendo a tratamento. Ele pode decidir pelo não tratamento, desde o início, e pode também decidir pela interrupção do tratamento que ele considera fútil.
O princípio da não-futilidade exige o respeito pela dignidade da vida. O respeito pela dignidade da vida exige o reconhecimento de que "tratamentos" inúteis ou fúteis apenas prolongam uma mera "vida biológica" [07], sem nenhum outro resultado. A não intervenção, desejada pelo paciente, não é uma forma de eutanásia, com provocação da morte ou aceleração desta, é o reconhecimento da morte como elemento da vida humana, é da condição humana ser mortal. É humano deixar que a morte ocorra sem o recurso a meios artificiais que prolonguem inutilmente a agonia.

2 Direito de morrer dignamente e direito à morte: distinção

O direito de morrer dignamente não deve ser confundido com direito à morte.
O direito de morrer dignamente é a reivindicação por vários direitos e situações jurídicas, como a dignidade da pessoa, a liberdade, a autonomia, a consciência, os direitos de personalidade. Refere-se ao desejo de se ter uma morte natural, humanizada, sem o prolongamento da agonia por parte de um tratamento inútil.
Isso não se confunde com o direito de morrer. Este tem sido reivindicado como sinônimo de eutanásia ou de auxílio a suicídio, que são intervenções que causam a morte.
Defender o direito de morrer dignamente não se trata de defender qualquer procedimento que cause a morte do paciente, mas de reconhecer sua liberdade e sua autodeterminação.
O artigo 5º da Constituição Federal de 1988 garante a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade e à segurança, dentre outros. Ocorre que tais direitos não são absolutos. E, principalmente, não são deveres. O artigo 5º não estabelece deveres de vida, liberdade e segurança.
Os incisos do artigo 5º estabelecem os termos nos quais estes direitos são garantidos: II – ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei; III – ninguém será submetido a tortura nem a tratamento degradante; IV – é livre a manifestação de pensamento...; VI – é inviolável a liberdade de consciência e de crença...; VIII – ninguém será privado de direitos por motivo de crença religiosa ou de convicção filosófica ou política, salvo se as invocar para eximir-se de obrigação legal a todos imposta e recusar-se a cumprir prestação alternativa, fixada em lei; X – são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito a indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação; XXXV – a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito".
Assim, é assegurado o direito (não o dever) à vida, e não se admite que o paciente seja obrigado a se submeter a tratamento. O direito do paciente de não se submeter ao tratamento ou de interrompê-lo é conseqüência da garantia constitucional de sua liberdade, de sua liberdade de consciência (como nos casos de Testemunhas de Jeová), de sua autonomia jurídica, da inviolabilidade de sua vida privada e intimidade e, além disso, da dignidade da pessoa, erigida a fundamento da República Federativa do Brasil, no art. 1º da Constituição Federal. O inciso XXXV do art. 5º garante, inclusive, o direito de o paciente recorrer ao Judiciário para impedir qualquer intervenção ilícita em seu corpo contra sua vontade. A inviolabilidade à segurança envolve a inviolabilidade à integridade física e mental. Isso leva à proibição, por exemplo, de intervenções não admitidas pelo paciente em sua saúde física ou mental (ou mesmo na ausência de saúde completa).

3 Eutanásia, auxílio a suicídio, distanásia e ortotanásia: delimitações conceituais necessárias

Além de serem diversos os posicionamentos a respeito da eutanásia, também são variados os significados que os autores dão a esta expressão e a termos a ela correlatos. Para uma abordagem jurídica do tema, é necessária a delimitação dos conceitos de eutanásia verdadeira, distanásia, ortotanásia e auxílio ao suicídio.
Etimologicamente, a palavra eutanásia significa boa morte ou morte sem dor, tranqüila, sem sofrimento. Deriva dos vocábulos gregos eu, que pode significar bem, bom e thanatos, morte. No sentido que tinha em sua origem, a palavra eutanásia significaria, então, morte doce, morte sem sofrimento.
O primeiro sentido de euthanatos faz referência a facilitar o processo de morte, sem, entretanto, interferência neste. Na verdade, conforme o sentido originário da expressão, seriam medidas eutanásicas não a morte, mas os cuidados paliativos do sofrimento, como acompanhamento psicológico do doente e outros meios de controle da dor. Também seria uma medida eutanásica a interrupção de tratamentos inúteis ou que prolongassem a agonia. Ou seja: a eutanásia não visaria à morte, mas a deixar que esta ocorra da forma menos dolorosa possível. A intenção da eutanásia, em sua origem, não era causar a morte, mesmo que fosse para fazer cessar os sofrimentos da pessoa doente.
Atualmente, porém, tem se falado de eutanásia como uma morte provocada por sentimento de piedade à pessoa que sofre. Ao invés de deixar a morte acontecer, a eutanásia, no sentido atual, age sobre a morte, antecipando-a. O conceito foi modificado e tem causado muita confusão.
Utilizando a concepção atual da expressão, admite-se que só se pode falar em eutanásia quando ocorre a morte movida por piedade, por compaixão em relação ao doente. A eutanásia verdadeira é a morte provocada em paciente vítima de forte sofrimento e doença incurável, motivada por compaixão. Se a doença não for incurável, afasta-se a eutanásia. Diante do Código Penal brasileiro, o que acabamos de chamar de eutanásia pode atualmente ser considerada homicídio privilegiado. Se não estiverem presentes aqueles requisitos, cai-se na hipótese de homicídio simples ou qualificado, dependendo do caso.
Quando se busca simplesmente causar morte, sem a motivação humanística, não se pode falar sobre eutanásia. A eutanásia é comumente provocada por parentes, amigos e médicos do paciente. Por isso, a eutanásia eugênica, utilizada pelo nazismo alemão contra judeus e doentes, não é considerada eutanásia própria, mas hipótese de homicídio simples ou qualificado. Também a morte de velhos, pessoas com deformações e doentes, mesmo incuráveis, mas que não se encontram em estado terminal e submetidos a forte sofrimento, também não é eutanásia (que se encaixa, no direito brasileiro atual, na hipótese de homicídio privilegiado).
Só é eutanásia a morte provocada em doente com doença incurável, em estado terminal e que passa por fortes sofrimentos, movida por compaixão ou piedade em relação ao doente. E constitui crime de homicídio, perante o atual Código Penal.
Alguns códigos penais em outros países prevêem diminuição de pena para a eutanásia.
Maria Helena Diniz relata que os Códigos Penais da Alemanha, da Suíça e da Itália encaixam a eutanásia no tipo de homicídio atenuado por motivo piedoso, não se admitindo absolvição nem perdão judicial [08].
No Brasil não há tipo específico para a eutanásia. O Código Penal brasileiro não faz referência à eutanásia. Conforme a conduta, esta pode se encaixar na previsão do homicídio, do auxílio ao suicídio ou pode, ainda, ser atípica. No Brasil, o que se chama de eutanásia é considerado crime. Encaixa-se na previsão do art. 121, homicídio. Se se trata mesmo da eutanásia verdadeira, cometida por motivo de piedade ou compaixão para com o doente, aplica-se a causa de diminuição de pena do parágrafo 1º do artigo 121, que prevê: "Se o agente comete o crime impelido por motivo de relevante valor social ou moral, ou sob domínio de violenta emoção, logo em seguida a injusta provocação da vítima, o juiz pode reduzir a pena de um sexto a um terço". Inclusive o médico pode cometer a eutanásia e sua conduta se subsume ao referido tipo legal.
O auxílio a suicídio de pessoa que não se encontra em estado terminal e com fortes dores, da mesma forma, não se caracteriza como eutanásia, mas como o simples auxílio a suicídio previsto no Código Penal. Quem executa o ato que vai causar a morte é a própria vítima. Para que a ação de auxílio a suicídio tenha a valoração de eutanásia, é preciso que o paciente tenha solicitado a ajuda para morrer, diante do fracasso dos métodos terapêuticos e dos paliativos contra as dores, o que acaba por retirar a dignidade do paciente, segundo seu próprio entendimento.
O suicídio assistido, ou o auxílio ao suicídio, é também crime. Ocorre com a participação material, quando alguém ajuda a vítima a se matar oferecendo-lhe meios idôneos para tal. Assim, um médico, enfermeiro, amigo ou parente, ou qualquer outra pessoa, ao deixar disponível e ao alcance do paciente certa droga em dose capaz de lhe causar a morte, mesmo com a solicitação deste, incorre nas penas do auxílio ao suicídio. A vítima é quem provoca, por atos seus, sua própria morte. Se o ato que visa à morte é realizado por outrem, este responde por homicídio, não por auxílio ao suicídio. A solicitação ou o consentimento do ofendido não afastam a ilicitude da conduta.
Um outro termo relacionado à eutanásia é a distanásia. Chama-se de distanásia o prolongamento artificial do processo de morte, com sofrimento do doente. É uma ocasião em que se prolonga a agonia, artificialmente, mesmo que os conhecimentos médicos, no momento, não prevejam possibilidade de cura ou de melhora. É expressão da obstinação terapêutica pelo tratamento e pela tecnologia, sem a devida atenção em relação ao ser humano. Ao invés de se permitir ao paciente uma morte natural, prolonga-se sua agonia, sem que nem o paciente nem a equipe médica tenham reais expectativas de sucesso ou de uma qualidade de vida melhor para o paciente. Conforme Maria Helena Diniz, "trata-se do prolongamento exagerado da morte de um paciente terminal ou tratamento inútil. Não visa prolongar a vida, mas sim o processo de morte" [09].
Em oposição à distanásia, surge o conceito de ortotanásia. Etimologicamente, ortotanásia significa morte correta: orto: certo, thanatos: morte. Significa o não prolongamento artificial do processo de morte, além do que seria o processo natural. A ortotanásia deve ser praticada pelo médico.
Na situação em que ocorre a ortotanásia, o doente já se encontra em processo natural de morte, processo este que recebe uma contribuição do médico no sentido de deixar que esse estado se desenvolva no seu curso natural. Apenas o médico pode realizar a ortotanásia. Entende-se que o médico não está obrigado a prolongar o processo de morte do paciente, por meios artificiais, sem que este tenha requerido que o médico assim agisse. Além disso, o médico não é obrigado a prolongar a vida do paciente contra a vontade deste. A ortotanásia é conduta atípica frente ao Código Penal, pois não é causa de morte da pessoa, uma vez que o processo de morte já está instalado.
A ortotanásia serviria, então, para evitar a distanásia. Ao invés de se prolongar artificialmente o processo de morte (distanásia), deixa-se que este se desenvolva naturalmente (ortotanásia). Maria Celeste Cordeiro dos Santos entende que este auxílio à morte "é lícito sempre que ocorra sem encurtamento da vida" [10]; a autora chama a ortotanásia também de "auxílio médico à morte", entendendo que "o médico (e só ele) não é obrigado a intervir no prolongamento da vida do paciente além do seu período natural, salvo de tal lhe for expressamente requerido pelo doente" [11].
De outro lado, admite-se, amplamente, que, diante de dores intensas sofridas pelo paciente terminal, consideradas por este como intoleráveis e inúteis, o médico deve agir para amenizá-las, mesmo que a conseqüência venha a ser, indiretamente, a morte do paciente [12].
O autor espanhol Ramón Martín Mateo teceu críticas a certa jurisprudência espanhola que ordenou a intervenção médica a despeito da recusa do paciente. Segundo o autor, "esta jurisprudência segue uma linha equivocada, ao hipostasiar o direito à vida, quando está demonstrado à saciedade que para muitos sujeitos este bem é inferior ao implicado em respeito a determinados valores e crenças" [13].
Para Ramón Martín Mateo, não há dúvidas sobre a licitude da ortotanásia [14]. Porém, há algumas objeções na doutrina. O principal argumento contrário é o de que, com o intenso desenvolvimento do conhecimento médico, a determinação da irreversibilidade de um quadro de saúde pode ser falha. Além disso, há casos em que a determinação da morte como já ocorrida é falha e algumas pessoas, dadas como mortas, despertam durante o velório ou até mesmo depois que o enterro já finalizou. São riscos próprios dos limites do conhecimento tecnológico que exigem cuidado nos critérios sobre a morte. Na verdade, a discussão é muito mais ampla que a licitude ou a ilicitude da ortotanásia. Trata-se da indagação sobre os limites ou possibilidades do conhecimento científico num determinado momento. Por causa da consciência da existência desses limites, os cuidados contra o arbítrio devem ser maximizados.
Diferente de ortotanásia é a situação do paciente que já se encontra em morte cerebral ou encefálica. Neste caso, a pessoa já está morta, permitindo a lei, inclusive, não apenas que os aparelhos sejam desligados, mas que seus órgãos sejam retirados para fins de transplantes.

4 Eutanásia e ortotanásia no Direito Penal projetado

Em 1984, juntamente com a proposta de reforma da Parte Geral do Código Penal, havia também um anteprojeto para modificação da Parte Especial. A modificação da Parte Especial não ocorreu. Esse anteprojeto da Parte Especial do Código Penal Brasileiro previa expressamente a ortotanásia, no art. 121, § 4º: "Não constitui crime deixar de manter a vida de alguém, por meio artificial, se previamente atestada, por dois médicos, a morte como iminente e inevitável, e desde que haja consentimento do doente ou, na sua impossibilidade, de ascendente, descendente, cônjuge ou irmão".
Observe-se que o texto se referia à definição dada à ortotanásia e não à eutanásia. O parágrafo 3º previa a situação em que o processo de morte já se iniciou, estando a vida mantida artificialmente, sem chance de cura ou melhora. Nesta situação há apenas o prolongamento do processo de morte natural, por via artificial. Não é a previsão da eutanásia, em que tal processo ainda não se iniciou, embora sofra o paciente de doença incurável. Na eutanásia produz-se a causa imediata da morte, o que é crime, encaixando-se a conduta na previsão do homicídio privilegiado do texto do Código Penal atual.
O Anteprojeto de Reforma da Parte Especial do Código Penal Brasileiro prevê, no art. 121:

"Eutanásia

§ 3º Se o autor do crime agiu por compaixão, a pedido da vítima imputável e maior, para abreviar-lhe sofrimento físico insuportável, em razão de doença grave:

Pena – Reclusão de três a seis anos.

Exclusão de ilicitude

§ 4º Não constitui crime deixar de manter a vida de alguém por meio artificial, se previamente atestada por dois médicos, a morte como iminente e inevitável, e desde que haja consentimento do paciente, ou na sua impossibilidade, de ascendente, descendente, cônjuge, companheiro ou irmão".

Quanto ao parágrafo 3º, entende-se que o fato de a doença ser grave apenas não deve ser suficiente para o privilégio da pena reduzida do crime de homicídio, devendo a doença ser também incurável e tratar-se de paciente terminal.

Deve-se lembrar que a lei de transplante de órgãos determina que o médico que atesta a morte não pode pertencer à equipe de médicos responsável pelos transplantes de órgãos.

A ortotanásia, prevista no parágrafo 4º, é causa de exclusão de ilicitude.

Verifica-se que em ambos os casos há a exigência do "pedido da vítima" e do "consentimento do paciente", tanto para a configuração da eutanásia quanto para a configuração da ortotanásia, que é excludente de ilicitude, se bem que, neste último caso, a proposta admite que o consentimento seja dado por ascendente, descendente, cônjuge, companheiro ou irmão. Esta tipificação de eutanásia difere das definições que a maioria da doutrina dá para a expressão: necessariamente, não se exige o consentimento do paciente na maioria das definições.

No Código Penal atual, o pedido da vítima não afasta a ilicitude, sendo o consentimento, no texto, irrelevante para a caracterização do que se chama de eutanásia. Este detalhe, na verdade, é um dos mais difíceis, na prática, com o qual lidar: como valorar o consentimento?

Maria Helena Diniz informa que em 1991, foi aprovada uma lei nos Estados Unidos sobre a autodeterminação do paciente, The Patient Self-Determination Act – PSDA. Segundo a lei, no momento da admissão do paciente, o hospital deve informá-lo sobre seu direito de aceitar ou recusar o tratamento, visando-se, com isso, à garantia da autodeterminação do paciente e à participação deste nas decisões quanto à sua saúde e à sua vida. A lei recomenda, inclusive, que o paciente se utilize de "ordens antecipadas (advance directives)" sobre o tratamento [15]. De acordo com a autora, com base na lei PSDA, o paciente pode estabelecer sua decisão de três formas: a) declaração expressa do próprio paciente, através de testamento vital (living will); b) decisão por parte do representante legal específico, ou seja, de um curador com competência específica de tomar decisões quanto à saúde do paciente, figura admitida também no Código Civil de Quebec; c) decisão do paciente, dirigida ao médico, após consulta a este, sobre o tipo de tratamento que deseja receber num futuro estado terminal, em documentos escrito [16].
No entanto, a defesa da autonomia do paciente não pode afastar uma indagação feita por Maria Helena Diniz quanto a possíveis defeitos na formação da declaração de vontade do paciente: "Poder-se-ia exaltar esse poder decisório do doente, ante o fato de que a autonomia de sua vontade pode ser uma arma contra ele mesmo, porque a decisão, em regra, vale conforme o seu grau de esclarecimento ou informação?" [17]. Portanto, é imprescindível a preocupação com as circunstâncias em que se forma a vontade do paciente, devendo-se afastar, ao máximo, todos os fatores que possa interferir ou reduzir sua capacidade de compreensão e de decisão livre.

5 Testamento vital

Ao lado da figura do consentimento informado e esclarecido, aparece o testamento vital, também chamado de testamento biológico, testamento em vida, living will, testament de vie.
O testamento vital é um documento em que a pessoa determina, de forma escrita, que tipo de tratamento ou não tratamento que deseja para a ocasião em que se encontrar doente, em estado incurável ou terminal, e incapaz de manifestar sua vontade. Visa-se, com o testamento vital, a influir sobre os médicos no sentido de uma determinada forma de tratamento ou, simplesmente, no sentido do não tratamento, como uma vontade do paciente que pode vir a estar impedido de manifestar sua vontade em razão da doença.
No Brasil não há regulamentação sobre o testamento vital, mas admitimos sua validade, diante da autonomia da pessoa e do princípio da dignidade.
Nos Estados Unidos esse documento tem valor legal, tendo surgido com o Natural Death Act, na Califórnia, na década de 1970. Exige-se que o testamento vital seja assinado por pessoa maior e capaz, perante duas testemunhas independentes e que só tenha efeitos depois de quatorze dias da assinatura, sendo revogável a qualquer tempo. Além disso, tem um valor limitado no tempo, de aproximadamente cinco anos. O estado de fase terminal deve ser atestado por dois médicos. O médico que desrespeita as disposições do testamento sofre sanções disciplinares [18].
O testamento vital, ao lado de evitar os procedimentos médicos desmedidos, evita que o médico seja processado por não ter procedido a um procedimento em paciente em fase terminal, conforme solicitado por este no documento.
Maria Isabel de Azevedo Souza, ao reconhecer o direito de autodeterminação do paciente, inclusive quanto ao momento de sua morte, afirma que, nesse caso,

"tem lugar a discussão acerca da manifestação antecipada da pessoa sobre as medidas a serem tomadas para o caso em que não possa mais se manifestar através dos chamados testamentos vitais (living-will) e do consentimento por substituição" [19].

Tereza Rodrigues Vieira conta que, nos Estados Unidos, a organização Choice in Dying orienta sobre os direitos de pacientes terminais e oferece modelos de procurações para que outras pessoas possam tomar decisões médicas em nome do paciente, caso este fique incapaz de tomá-las [20].
Maria Helena Diniz apresenta um modelo de documento que pode ter a mesma finalidade, chamado "Diretrizes Antecipadas Relativas a Tratamentos de Saúde e Outorga de Procuração", pelo qual uma pessoa poderia se posicionar sobre tratamentos médicos a que viesse se submeter, independentemente das conseqüências de sua recusa ao tratamento e independentemente do posicionamento contrário de seus familiares [21].
Maria Celeste Cordeiro dos Santos apresenta, em sua obra O equilíbrio do pêndulo: a bioética e a lei, implicações médico-legais, um exemplo de testamento vital. [22]

Conclusão

O livre desenvolvimento da personalidade humana está intrinsecamente ligado à idéia de autonomia do sujeito, de âmbito de autodeterminação jurídica, pois a liberdade é imprescindível para a materialização dos direitos de personalidade, para o livre desenvolvimento da pessoa, para sua dignidade.
É necessário refletir sobre o grau de autonomia jurídica que a pessoa tem quanto ao processo de morte. Afastando-se a eutanásia, a idéia de morte digna permite à pessoa a autodeterminação a respeito dos últimos momentos de sua vida, com poderes, inclusive, para elaborar documentos que vinculem terceiros, como no caso do testamento vital. O reconhecimento da autonomia da pessoa quanto a esses momentos é imprescindível para a garantia de sua dignidade. Por isso, embora no Brasil, atualmente, a eutanásia e o auxílio ao suicídio sejam considerados condutas ilícita, não o é a ortotanásia, procedimento utilizado para se afastar a distanásia.
Deve-se compreender que a dignidade da pessoa humana não é um conceito objetivo, absoluto, geral, possível de ser abstraído em padrões morais de conduta e a serem impostos a todas as pessoas. Sem a consideração da alteridade e da tolerância, ignorando-se a pluralidade e a complexidade da sociedade atual, o uso do princípio da dignidade humana pode ser usado para a negação da pessoa, para a homogeneização dos indivíduos e para a negação da dignidade.

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Notas
01 Cf. BORGES, Roxana Cardoso Brasileiro. Direito de morrer dignamente: eutanásia, ortotanásia, consentimento informado, testamento vital, análise constitucional e penal e direito comparado. In: SANTOS, Maria Celeste Cordeiro Leite dos (org.). Biodireito: ciência da vida, os novos desafios. São Paulo: RT, 2001.
02 BAUDOUIN, Jean-Louis, BLONDEAU, Danielle. Éthique de la mort et droit à la mort. Paris: Press Universitaires de France, 1993, p. 89.
03 Ibidem, loc. cit.
04 Ibidem, p. 107.
05 ENCICLOPEDIA del diritto. Aggiornamento. V. I. Italia: Giuffrè, 1997. Vocábulo Bioetica (diritto internazionale), p. 253.
06 MEIRELLES, Jussara, TEIXEIRA, Eduardo Didonet. Consentimento livre, dignidade e saúde pública: o paciente hipossuficiente. In: RAMOS, Carmem Lúcia Nogueira et al (orgs.). Diálogos sobre direito civil: construindo uma racionalidade contemporânea. Rio de Janeiro: Renovar, 2002, p. 371.
07 BAUDOUIN, J. L., BLONDEAU, D. Op. cit., p. 104.
08 DINIZ, Maria Helena. O estado atual do biodireito. São Paulo: Saraiva, 2001, p. 307.
09 Ibidem, p. 316.
10 SANTOS, Maria Celeste Cordeiro Leite dos. O equilíbrio do pêndulo: a bioética e a lei, implicações médico-legais. São Paulo: Ícone, 1998, p. 107.
11 Ibidem, p. 110.
12 VIEIRA, Tereza Rodrigues. Bioética e direito. São Paulo: Jurídica Brasileira, 1999, p. 90.
13 MATEO, Ramón Martín. Bioética y derecho. Barcelona: Ariel, 1987, p. 106.
14 Op. cit., p. 105.
15 Op. cit., p. 335.
16 Ibidem, p. 336-337.
17 Ibidem, p. 337.
18 BAUDOUIN, J. L., BLONDEAU, D. Op. cit., p. 93.
19 Op. cit., p. 316.
20 Op. cit., p. 90.
21 Op. cit., p. 206-207.
22 P. 13-14.


Roxana Cardoso Brasileiro Borges

Texto inserido no Jus Navigandi nº871 (21.11.2005), Elaborado em 04.2005.

BORGES, Roxana Cardoso Brasileiro. Eutanásia, ortotanásia e distanásia: breves considerações a partir do biodireito brasileiro. Jus Navigandi, Teresina, ano 10, n. 871, 21 nov. 2005. Disponível em: . Acesso em: 01 dez. 2006. (cf. NBR 6023:2000)

Apometria: uma técnica espiritualista

PONTO DE DISCUSSÃO


Responsável por discussões nas casas espíritas, a apometria se constitui técnica espiritualista desenvolvida e basicamente utilizada por profissionais da área médica, não sendo, portanto, assunto afeto à Doutrina Espírita.

Neste artigo, a história e algumas informações sobre o tema.

Cleyde Novo de Almeida


Em 1965, um psiquista portorriquenho não-espírita, que se ocupava dos estudos da alma, chamado Luiz Rodrigues, residente, nesse tempo, no Rio de Janeiro, esteve em Porto Alegre, e, a convite de Conrado Ferrari, na época presidente do Hospital Espírita daquela cidade, realizou algumas demonstrações de uma técnica, chamada por ele de “Hipnometria” e que era utilizada para o tratamento de enfermidades em geral, com resultados aparentemente satisfatórios.

A importância desse trabalho residia em obter, com certa facilidade e rapidez, o desdobramento do “corpo astral”, tanto da sensitiva (sua enfermeira particular), como do paciente, para a dimensão extrafísica, através da aplicação de pulsos magnéticos concentrados e progressivos. Ao mesmo tempo, por sugestão, comandava esse afastamento para o plano astral, onde equipes de médicos e enfermeiros desencarnados orientavam nas tarefas de diagnósticos e terapêutica.

André Luiz, em Mecanismos da Mediunidade, no capítulo XXI, página 149, informa que “quem possa observar, reparará, à medida (que) se afirme a ordem do hipnotizador, ...escapa abundantemente do tórax do subjet caído em transe, um vapor branquicento que, em se condensando qual nuvem inesperada, se converte... numa duplicata dele próprio, quase sempre em proporções ligeiramente dilatadas” ... “o sensitivo, desligado da veste física, passa a movimentar-se e, ausentando-se muita vez do recinto da experiência, atendendo a determinações recebidas, pode efetuar apontamentos a longa distância ou transmitir notícias, com vistas a certos fins”.

Nessa época, José Lacerda de Azevedo, médico formado em 1950 pela Faculdade de Medicina da Universidade do Rio Grande do Sul e trabalhando Já há algum tempo na Doutrina Espírita, assistiu a duas dessas demonstrações. Homem de ciência, interessado no aspecto experimental do Espiritismo, tendo adquirido, com o passar dos anos, grande conhecimento graças à meticulosa e profunda observação realizada no campo mediúnico, ficou muito interessado nessa nova técnica, e, como só poderia acontecer, resolveu conhecê-la melhor, colocando-a em prática.

Começou a experiência, usando sua própria esposa, Dona Yolanda, médium desenvolvida. Com surpresa, constatou a eficiência e percebeu nesse procedimento um grande campo de investigação e aplicação nas tarefas de socorro aos sofredores de todos os matizes. Usando apenas médiuns acostumados ao trabalho de intercâmbio, instaurou um melhor relacionamento com o mundo espiritual (ver nota 1) e, com isso, os medianeiros podiam descrever detalhadamente os acontecimentos, os encontros com os desencarnados e transmitir as orientações da equipe do plano espiritual.

André Luiz, em Mecanismos da Mediunidade, capítulo XXI, página 155, ensina: "É imperioso notar.. que considerável número de pessoas, principalmente as que se adestraram para esse fim, efetuam incursões nos planos do Espírito, transformando-se, muitas vezes, em preciosos instrumentos dos Benfeitores da Espiri­tualidade, como oficiais de ligação entre a esfera física e a extrafísica".

Animado com os resultados, o Dr. Lacerda passou a utilizar e a desenvolver, cada vez mais, essa técnica, verificando logo de início, possibilidades novas e um imenso campo para experimentação, se conduzida com método objetivo e sistemático.

Não se esqueça, por oportuno, que em O Evangelho Segundo o Espiritismo, capítulo XIX, item 5, encontra-se o seguinte: “o poder da fé participa da ação direta e especial do magnetismo, com cujo fluido, como agente universal, o Homem age, modificando-lhe as propriedades e dando-lhe uma impulsão, por assim dizer irresistível. Por isso, quem reunir à fé ardente uma grande potência fluídica normal, pode, pela simples vontade dirigida para o bem, operar extraordinários fenômenos de cura e outros, outrora considerados prodígios, e que são apenas consequentes de uma lei natural”...

Atento a todas essas informações, José Lacerda percebeu que esse método devidamente utilizado descortinava possibilidades de progresso no tratamento dos transtornos e distúrbios espirituais. Constatou ser uma técnica eficiente de desdobramento induzido do perispírito, eficaz nos diagnósticos e tratamentos, além de desenvolver as qualidades mediúnicas.

Novamente André Luiz vem em auxílio explicando no capítulo XIV de Mecanismos da Mediunidade, página 108, que: "se o passivo prossegue interessado no progresso de suas conquistas espirituais este consegue, à custa de esforço, por intermédio da profunda concentração das energias mentais,... cair em hipnose ou letargia, catalepsia ou sonambulismo - ainda pelo reflexo condicionado igualmente específico - afastando-se do envoltório carnal, em plena consciência, para entrar em contacto com entidades encarnadas ou desencarnadas de sua condição ou para provocar por si mesmo certa categoria de fenômenos físicos, mediante a aplicação de energia acumulada, ... nas quais a própria vontade do operador parcial, ou integralmente separado do corpo somático, exerce determinada ação sobre as células físicas e extrafísicas, estabelecendo acontecimentos inabituais para o mundo rotineiro dos cinco sentidos".

E no mesmo livro, no capítulo XVIII na página 133, informa: "Quanto mais se lhe acentuem o aperfeiçoamento e a abnegação, a cultura e o desinteresse, mais se lhe sutilizam os pensamentos, e com isso, mais lhe aguçam as percepções mediúnicas, que se elevam a maior demonstração de serviço, de acordo com as suas disposições individuais".

Por achar que o nome Hipnometria, não estava adequado, pois o método, nada tinha a ver com o sono, Lacerda, deu-lhe o nome de Apometria, palavra que vem do grego apo (além de, fora de, afastamento, separação, distanciamento) e metron (relativo à medida de tempo). Portanto, apometria é a junção dos dois conceitos formando uma nova palavra.

Ela é apenas, repita-se, uma técnica. A técnica de "separação entre os componentes somáticos do Homem e sua constituição espiritual. E viabiliza o tratamento dos diversos níveis energéticos do Ser, através da intervenção dos mentores espirituais e dos médiuns.

No livro Apometria vista do Além, na página 196, recolhemos a seguinte informação: "Quando temos um conjunto de encarnados num trabalho de apometria, os Espíritos agilizarão uma tão forte corrente magnética tirada dos médiuns, que o obsessor abandonará rapidamente aquele campo magnético e raramente retornará para continuar obsediando: Retiramos o fluido magnético dos médiuns e depositamos também no reencarnado obsediado; juntas nesse magnetismo, as energias formarão um campo protetor em cujo raio o obsessor encontrará enorme e intransponível dificuldade de penetração.

Isso é um recurso extraordinário da apometria. Um trabalho conjunto da Espiritualidade com os médiuns.

Uma das informações que ficou muito clara com a orientação sistemática do plano espiritual é a da necessidade de reforma íntima: isto é, reeducação para uma vida saudável, através de realizações humanitárias.

Jesus, em Mt 5:24, mostra-nos a necessidade da reconciliação com nossos irmãos e, mais adiante, no mesmo capitulo no versículo 39, ensina a importância da "não resistência ao mal". Ao curarmos as nossas enfermidades espirituais com a ação dos nossos pensamentos e de nossas obras, estaremos influindo positivamente na melhora de nossos males físicos.

O Cristo foi absolutamente claro quando explicou em Mt 15:11 e 19-20 que o que "mancha o Homem não é o que entra pela boca, mas o que sai dele: os maus pensamentos, os adultérios, as impurezas, os falsos testemunhos, as calúnias etc". Cita ainda um provérbio em Lc 4:23 dizendo:

"Médico cura-te a ti mesmo", mostrando que é dever de cada um o equilíbrio de seu corpo e de seu Espírito.

Ainda é André Luiz, em Mecanismos da Mediunidade capítulo XIV, página 106, quem fala da hipnoterapia dizendo:

“Enquanto adormecido, a própria onda metal do paciente, em movimento renovador e guardando consigo as sugestões benéficas recebidas, atua sobre as células do veículo fisiopsicossomático, anulando tanto quanto possível, as inibições .funcionais existentes”... “o magnetizador agiu apenas como recurso de excitação e influência, porque as oscilações mentais em ação restaurativa dos tecidos celulares foram exteriorizadas pelo próprio consulente”.

Em muitas passagens dos Evangelhos, o Mestre exorta à fé, ao amor, à oração e à vigilância, como armas para a nossa saúde física e mental e para a nossa paz. Essa é uma lição que não pode e nem deve ser esquecida. Em resumo, cada um faz o seu “próprio milagre”, pelo esforço pessoal e pelo amor fraterno. Em Mt 16:27 Jesus reproduzindo preceito ao Velho Testamento (ver nota 2) lembra que o Pai, “recompensará a cada um segundo suas obras”.

A apometria, pois, "é uma ato de fé, portanto um ponto de partida", não faz parte de nenhuma seita ou religião determinada. É técnica e, como tal, pode e deve ser bem usada, para beneficiar todos os necessitados, encarnados e desencarnados, em qualquer instituição religiosa ou não, que busque levar socorro e atendimento fraterno, tanto espiritual quanto físico. Ela está "entrelaçada com a Física, com a Teologia e com conhecimento ou Inteligência Superior". Esse desdobramento induzido vem sendo utilizado em alguns “centros Espíritas que se especializaram, abrindo assim, novos horizontes para a realização da Medicina Espiritual”.


Críticas e objeções

Uma das críticas à apometria é a incredibilidade quanto aos médiuns desdobrados poderem plasmar no Além aparatos de correção e de operação destrutiva de certas massas fluídicas ou algumas construções etc. (âmbito, espíritos trevosos). O encarnado servir-se-á de seus fluidos térmicos para auxiliar os mais humildes, os enfermos, os necessitados em geral.
As possibilidades de evolução moral estão dentro de cada um de nós, aprimorando a inteligência e despertando a consciência. Com raras exceções, são os Espíritos desencarnados que utilizam parte desses fluidos para construir aparelhos e veículos, empregando-os também nas cirurgias espirituais etc,, onde são plasmados os aparatos específicos para cada caso.
Sem que o médium tenha conhecimento e vivência moral, essa técnica poderá desencadear um processo obsessivo de grandes proporções, pois pode açular sua vaidade e seu orgulho. O trabalhador mal preparado, vendo a rapidez com que se efetuam algumas curas, vangloria-se, achando que atingiu sozinho esses resultados, esquecido da constante atuação da Espiritualidade.
Essas objeções só vêm mostrar a necessidade constante e contínua da educação e da vigilância, para que haja conscientização do uso desse recurso. Trabalhos feitos com amor e caridade fraterna, cristãmente dedicados à elevação das criaturas sempre trazem progresso para todos (Apometria vista do além, capítulo 13).


Observação: o texto foi praticamente todo baseado no livro Apometria - Novos horizontes na Medicina Espiritual

Bibliografia:
Allan Kardec
. “O Livros dos Espíritos”, questão 433;
Allan Kardec. “O Evangelho Segundo o Espiritismo”, capítulo XIX, item 5;
André Luiz. “Mecanismos da Mediunidade”, capítulos XIV -XVIII-XXI, Ed. FEB, 8ª edição, ano 1984;
Bíblia Sagrada. Evangelho de Mateus - 5:24 -15:11.19-20-16:27;
Bíblia Sagrada. Evangelho de Lucas - 4:23;
Vítor Ronaldo Costa. “Apometria -Novos horizontes da Medicina Espiritual”, Ed. O Clarim - 2° edição - ano 2000 - toda a obra;
Dimas Silveira. “Apometria -Ponte para a Redenção”, Editoração Eletrônica: Millennium Comportamento, ano 1998/1999;
João Berbel, pelos Espíritos: Eurípedes Barsanulfo, Ismael Alonso, Miguel de Alcântara. “Apometria-vista do Além”- Editora DPL - ano 1999 -2° edição.


Nota 1 - Em O Livro dos Espíritos, questão 433, somos informados que “há disposições físicas que permitem ao Espírito libertar-se mais ou menos facilmente da matéria”;
Nota 2 -Jó 34:11 /Sl. 62:12/Prov. 12:14 e 24:42/Isaías 3:10,17:10/Jeremias 32:19 /Ezequiel 33:20,18:20, 7:27


Cleyde Novo de Almeida é expositora espírita, atuando fundamentalmente como dirigente de classe do Curso de Expositor Espírita da FEESP.


Publicado no jornal “O Semeador”, FEESP, São Paulo, novembro/2003, pp. 8-9

Wednesday, November 22, 2006

Aula 34 – Desobsessão

Desobsessão

Desobsessão, em sentido amplo, é o processo de regeneração da Humanidade. É o ser humano desvinculando-se do passado sombrio e vencendo a si mesmo. Em sentido restrito, é o tratamento das obsessões, orientado pela Doutrina Espírita.” (Suely Caldas Schubert)

1-Tipos de obsessão

Allan Kardec, através da Codificação, classificou a obsessão por seus estágios, sendo que, por isso mesmo, não tem um caráter definitivo, servindo apenas como parâmetro para estudo, uma vez que a obsessão é muito variada em seus aspectos, sendo difícil estabelecer onde uma fase começa e a outra termina.
1.1.OBSESSÃO SIMPLES - É a influência sutil na atitude do Espírito, encarnado ou desencarnado.
1.2.OBSESSÃO FASCINAÇÃO - Ação direta de um Espírito sobre o pensamento de outro, provocando quadro de ilusão.
1.3.OBSESSÃO SUBJUGAÇÃO - É a paralisação através da ação mental, que um Espírito determina sobre a vontade de outro.

2-Participantes dos processos obsessivos

2.1-Encarnado para encarnado;
2.2-Desencarnado para desencarnado;
2.3-Encarnado para desencarnado;
2.4-Desencarnado para encarnado;
2.5-Auto-Obsessão (quadros mentais, idéias-fixas, manias).


3-Proteção contra o assédio de obsessores

Há meios de nos protegermos contra a obsessão.

3.1-Reforma íntima
A ação dos obsessores encontra campo fértil nas mentes vazias ou inclinadas aos vícios.
Auto conhecimento: É um processo que passa pela reflexão diária e individual sobre os próprios atos, pensamentos e escolhas.
Vigiar e evitar as influências negativas: Somos acompanhados diariamente por uma “nuvem invisível” de assistentes espirituais sintonizados com nossos sentimentos, desejos, defeitos e qualidades. A atenção a nossos pensamentos nos permite conter idéias desabonadoras ou ensejadoras do mal.
Preservar-se contra vícios: A Terra é um planeta de provas e expiações aonde, diariamente, o mal se confronta com o bem, usando as fraquezas morais humanas como meio de conter a evolução de toda coletividade planetária. À medida que os seres superam suas fraquezas morais e seus vícios, tornam-se terreno estéril para as más influências do invisível.


3.2-Atitudes para Elevação Moral

O pensamento é uma poderosa fonte irradiadora de energia, capaz de vencer barreiras físicas, distâncias, intempéries. Lembre-se que os Espíritos buscam a companhia dos seres com quem se afinam em idéias e interesses. Nossas emanações mentais transitam como vibrações com a qualidade de nossas preocupações, emoções e condição moral.
Idéias torpes, sentimentos negativos e interesses mesquinhos geram condições propícias a investidas obsessivas.
Para nutrir a elevação moral, afastando-nos de quadros de obsessão, precisamos melhorar nossos pensamentos, ocupando a mente com idéias salutares e, mesmo nas horas vazias, procurando atividades moralmente saudáveis. Sempre nos será valioso dedicar amor ao próximo, praticando a caridade e o perdão.


3.3-Prática da prece

A prece é uma projeção de nossos pensamentos, que expressa também nosso sentimento e, quando ditada pelo coração, sempre alcança a Deus.
Durante a prece a pessoa estabelece uma corrente fluídica cuja intensidade depende do teor vibratório de quem ora, residindo nisto o seu poder e o seu alcance, pois nesta relação fluídica atraímos a ajuda dos Espíritos Superiores para nos inspirar bons pensamentos, fortalecendo-nos contra o assédio de obsessores.


3.4-Prática do Evangelho no Lar

O culto do Evangelho no Lar é um instrumento de transformação íntima dos doentes da alma. A oportunidade de leitura do Evangelho e a reflexão sobre o mesmo, além das preces que poderão ser feitas, permitem o crescimento interior, o exercício da fé, gerando transformações como renúncia de viciações e de paixões inferiores, permitindo a vigilância do ser em seus pensamentos, palavras e atos.

4-Tratamento e cura da obsessão

A desobsessão, no sentido amplo da palavra, significa o “ato de curar alguém da obsessão.”
A cura espírita da obsessão baseia-se na conscientização do enfermo e do Espírito agressor, posto que o paciente, é o agente da própria cura.
Para isso a Doutrina Espírita propõe:
1.O esclarecimento através do estudo;
2.A renovação interior por intermédio da ação do pensamento e da vontade.

5-A Casa Espírita e a desobsessão

Muitas Casas Espíritas adotam tratamentos de desobsessão que incluem a freqüência a reuniões públicas combinadas com sessões de fluidoterapia na forma de aplicação de passes.
O êxito deste processo baseia-se na disciplina e na freqüência regular durante todo o período estipulado para tratamento. O paciente deve adotar pensamentos elevados e confiança na ação dos amigos espirituais.
Há quadros obsessivos que se estendem por décadas e mesmo por mais de uma encarnação e, ainda assim, oferecem possibilidades de solução. Qual o caminho? O primeiro passo é o esclarecimento das pessoas sobre a existência do problema. Quando tomamos conhecimento de um quadro de dificuldades temos a chance de contemplar-lhe as facetas e de buscar saídas para resolvê-lo. A Casa Espírita pode oferecer meios para tratar a desobsessão, porém, por maior que seja a dedicação de seus trabalhadores ou seu apoio, o caminho da desobsessão só poderá levar à cura se o paciente possuir compromisso e empenho, sobretudo nos aspectos que pedem sua colaboração no campo da melhoria moral.

Bibliografia: Francisco C. Xavier, médium, André Luiz, Espírito. “Desobsessão”; J. Herculano PiresObsessão, Passe, Doutrinação”; Portal do Espírito, www.espirito.org.br; Richard Simonetti, “Quem tem medo da obsessão?”; Suely Caldas Schubert, “Obsessão-Desobsessão: profilaxia e terapêutica espíritas”, Rio de Janeiro, FEB, 9ª ed., 1994.

Wednesday, November 08, 2006

Aula 33 – Obsessão

O que é a Obsessão?

1-Informações Preliminares

A obsessão se caracteriza pela ação de entidades espirituais inferiores sobre o psiquismo humano. Kardec distinguiu, em suas pesquisas, três graus do processo obsessivo: obsessão simples, subjugação e fascinação. No primeiro grau a infestação espiritual atinge a mente causando perturbações mentais; no segundo grau amplia-se aos centros da afetividade e da vontade, afetando os sentimentos e o sistema psicomotor, levando o obsedado a atitudes e gestos estranhos e tiques nervosos; no terceiro grau afeta a própria consciência da vítima, desencadeando processos alucinatórios.
As causas da obsessão decorrem de vários fatores, dos quais os mais freqüentes são: problemas reencarnatórios, tendências viciosas, egoísmo excessivo, ambições desmedidas, aversão a certas pessoas, ódio, sentimentos de vingança, futilidade, vaidade exagerada, apego ao dinheiro e assim por diante. Essas disposições da criatura atraem espíritos afins que a envolvem e são aceitos por ela como companheiros invisíveis. Os espíritos obsessores não são os únicos culpados da obsessão. Geralmente o maior culpado é a vítima.
Na Antigüidade a obsessão era tratada com violência. As práticas do exorcismo, até hoje vigentes no Judaísmo e no Catolicismo, destinam-se a afastar o demônio de maneira agressiva e violenta. No Espiritismo o método empregado é o da persuasão progressiva do obsessor e do obsedado. É o que se chama de doutrinação, ou seja, esclarecimento de ambos à luz da Doutrina Espírita. Não se usa nenhum ingrediente especial. Emprega-se apenas a prece e a conversação persuasiva. Esclarecido o obsedado, atinge-se o obsessor, que ficam, por assim dizer, vacinados contra novas ocorrências obsessivas.


2-O sentido da vida
Porquê e para quê vivemos? A resposta a esta pergunta é de importância para compreendermos o problema da obsessão. Segundo o Espiritismo, vivemos para desenvolver as potencialidades psíquicas de que todos somos dotados. Nossa existência terrena tem por fim a transcendência, ou seja, a superação constante da nossa condição humana. Desde o nascimento até o nosso último dia passamos pelas experiências que desenvolvem as nossas aptidões inatas, em todos os sentidos. A criança recém-nascida cresce dia a dia, desenvolve o seu organismo, aprende a comunicar-se com os outros, a falar e a raciocinar, a querer e a agir para conseguir o que quer. Transcende a condição em que nasceu e passa para as fases superiores da infância, entrando depois na adolescência e depois na mocidade, na madureza e na velhice. Ao fazer todo esse trajeto ela desenvolveu suas forças orgânicas e psíquicas, sua afetividade, sua capacidade de compreender o que se passa ao seu redor e seu poder de dominar as circunstâncias. Isso é transcender, elevar-se acima da condição em que nasceu. É para isso que vivemos. E isso nos mostra que o sentido da vida é transcendência. (...)O fato de vivermos muitas vidas na Terra, e não apenas uma, mostra que temos no inconsciente uma armazenagem de lembranças e conhecimentos, aspirações, frustrações e traumas muito maior que a descoberta por Freud.(...)
Se não compreendermos que a vida é transcendência, crescimento, elevação e desenvolvimento constante e comprovado do ser espiritual que somos, não poderemos encarar com naturalidade o problema da obsessão e lutar para resolvê-lo.

3-As dimensões da vida
O avanço atual da pesquisa científica no mundo, com a descoberta da antimatéria, do corpo- bioplásmico dos seres vivos (perispírito, segundo o Espiritismo), dos fenômenos paranormais e da sobrevivência humana após a morte física, bem como das comunicações mentais entre vivos e mortos (fenômenos théta da Parapsicologia) confirmou a descoberta espírita das várias dimensões da vida. Essas dimensões correspondem a diversas densidades da matéria, que permitem a existência dos mundos interpenetrados da teoria espírita.
A descoberta de que o pensamento e a mente não são físicos, mas extrafísicos (segundo a definição do Prof. Rhine) e semimateriais, segundo o Espiritismo, demonstrou a realidade dos diferentes planos de vida, habitados por seres humanos em diferentes graus de evolução.(...) A transcendência humana se realiza nos planos sucessivos, que vão desde o plano da matéria densa da Terra até os planos de matéria rarefeita que escapam aos nossos sentidos materiais. Não há mais lugar para a concepção materialista absoluta na cultura científica e filosófica do nosso tempo.


4-Freud e Kardec
Muitos psicólogos e psiquiatras acusam o Espiritismo de invadir os seus domínios científicos nos casos de perturbações mentais e psíquicas. Desconhecendo a Doutrina Espírita e sua história, não sabem que se deu exatamente o contrário. Afirmam que a Obsessão é uma perturbação decorrente de desequilíbrios endógenos, ou seja, das próprias estruturas psico–mentais do paciente em relação com os fatores ambientais. Atribuem quase tudo à constituição do paciente, a disfunções orgânicas e particularmente cerebrais ou afetivas. O inconsciente é geralmente a sede de todos os distúrbios psíquicos. Entendem que os espíritas confundem os fantasmas imaginários gerados por manifestações patológicas do paciente com fantasmas reais das mais antigas superstições mágicas e religiosas da Humanidade. Acham que o Espiritismo representa um processo de volta ao mundo da superstição.
Freud tinha apenas um ano de idade quando Kardec levantou o problema do inconsciente em termos científicos, nas suas pesquisas dos fenômenos espíritas, hoje chamados cientificamente de paranormais. Kardec foi mais fundo do que Freud no assunto, atingindo o problema dos arquétipos individuais e coletivos, que somente Adler e Jung iriam pesquisar mais tarde. (...) Freud encarou a questão dos sonhos nos limites da sua doutrina. Kardec, durante nada menos de doze anos, já havia realizado intensivas pesquisas de psicologia experimental (pioneirismo absoluto nesse campo) na Sociedade Parisiense de Estudos Espíritas. Hoje, as pesquisas parapsicológicas, realizadas nos maiores centros universitários de todo o mundo, comprovam inteiramente o acerto de Kardec.


Bibliografia: J. Herculano Pires, “Obsessão, Passe, Doutrinação”.